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Alterações na legislação trabalhista e a terceirização na construção civil – Por Maria Lucia Benhame

A terceirização na construção civil é uma realidade há décadas, contrato civil previsto no Código Civil desde 1916 e mantido no atual Código Civil (artigos 610 e seguintes).

No aspecto da legislação trabalhista, o instituto já estava previsto na CLT no seu artigo 455, que considera lícita a subempreitada, mas indica a responsabilidade solidária do contratante em relação aos empregados da contratada.

A questão, com a edição das alterações legais na Lei 6.019/74 através da Lei 13.429/17 e posteriormente pela Lei 13.467/17, é se tais alterações impactaram no ramo da construção civil.

Inexistia no ordenamento jurídico brasileiro uma lei específica para terceirização, que passou a ser “regulada” pela Súmula 331 do TST.

No ramo da construção civil então, no aspecto trabalhista, havia uma única disposição legal, contida no artigo 455 da CLT, e ainda a Súmula 331 e a OJ 191, ambos do TST — a última, da SDI-1

Considerando essas regras, o panorama na construção civil era o da responsabilidade solidária do tomador (artigo 455 da CLT), quando esse não era mero dono da obra, mas empresa da construção ou incorporação (OJ 191, SDI-1, TST).

Com a aplicação da Súmula 331 do TST, julgados passaram a aplicar a responsabilidade subsidiária, uma vez que os autores de ações trabalhistas não baseavam seu pedido em relação à tomadora no artigo 455 da CLT, havendo, no entanto, julgados deferindo a responsabilidade solidária do construtor e/ou incorporador (TRT-1 – Recurso Ordinário 00115595820145010244 RJ; TRT-2 – Recurso Ordinário 00018416920135020074; TRT-24 – Recurso Ordinário 00001831420135240004).

Em 2017 surgiram as alterações da Lei 6.019/74 para regulamentar a relação trabalhista nos contratos de prestação de serviços, mantendo-se o Código Civil como lei a regular o contrato entre as empresas.

Analisando-se o disposto na Lei 6.019 em sua nova redação, uma mudança essencial é a permissão para a terceirização de qualquer atividade da tomadora, inclusive de sua atividade principal (artigo 5A com redação da Lei 13.467/17).

No entanto, essa permissão a rigor já existia na empreitada, com base no artigo 455 da CLT, cujo caput estabelece:

Art. 455 – Nos contratos de subempreitada responderá o subempreiteiro pelas obrigações derivadas do contrato de trabalho que celebrar, cabendo, todavia, aos empregados, o direito de reclamação contra o empreiteiro principal pelo inadimplemento daquelas obrigações por parte do primeiro.

Ora, se a lei não veda a subempreitada e, ao contrário, regula a responsabilidade das empresas em relação ao empregado, é porque a terceirização da atividade-fim já era permitida no ramo da construção civil.

Portanto, nesse aspecto, a Lei 6.019 não impacta na construção civil.

Já quanto à responsabilidade ser subsidiária ou solidária, podemos vislumbrar um ponto de discussão.

O artigo 455 indica a possibilidade do empregado do subempreiteiro reclamar seus direitos do empreiteiro principal, e sendo assim, considera-se tal responsabilidade como solidária, com certeza, até a edição da Lei 6.019 com sua nova redação.

O artigo 5A da Lei 6.019 estabelece em seu parágrafo 5º a responsabilidade subsidiária do tomador/contratante:

§ 5º A empresa contratante é subsidiariamente responsável pelas obrigações trabalhistas referentes ao período em que ocorrer a prestação de serviços, e o recolhimento das contribuições previdenciárias observará o disposto no art. 31 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991.

Abeta a discussão sobre a regra do artigo 5A da Lei 6.019 ter derrogado a previsão da responsabilidade solidária do artigo 455 da CLT. Discussão, no entanto, com argumentos para os dois lados, uma vez que a Lei 6.019 trata da terceirização em geral, e a empreitada é um contrato típico, com regulamento civil e trabalhista específicos.

Dessa forma, as empresas tomadoras devem se precaver em relação aos contratos considerando que, na melhor das hipóteses, serão subsidiariamente responsáveis pelos direitos trabalhistas dos empregados do empreiteiro contratado.

Assim, devem tomar cuidados no aspecto da legislação civil, trabalhista e previdenciária.

Aspecto civil: o contrato a ser firmado é um contrato civil e, portanto, deve seguir as normas de validade do Direito Civil, sob pena de ser nulo ou anulável.

Nessa área, os cuidados envolvem a capacidade das partes contratante e sua representação, o objeto e forma do contrato.

Os cuidados envolvem desde a verificação do contrato social da empresa contratada para verificação da legalidade da representação bem como de seu objeto social.

O objeto social demonstrará se a empresa contratada pode assumir o trabalho contratado.

Assim, para uma contratação mais segura, na esfera civil devem ser seguidos os seguintes passos:

  • com a proposta contratual, pedir cópia do contrato social vigente e dados completos da empresa com CNPJ, inscrição estadual e endereço;
  • efetuar já nesse momento a pesquisa das ações civis trabalhistas e protestos;
  • analisar o tero e efetuar a assinatura do contrato para só então iniciar os serviços.

Além dos cuidados acima, que, na realidade, tratam do aspecto formal do contrato firmado, há que se considerar os cuidados exigidos para regularidade contratual na esfera trabalhista.

Área trabalhista

A terceirização é o ato da empresa tomadora de serviço entregar, através de um contrato regular, à outra empresa, prestadora de serviços, algumas atividades que a empresa prestadora possa prestar, ou seja, que seja um de seus objetivos sociais.

A terceirização sempre foi proibida, e os julgados sempre consideraram que o vínculo dava-se entre o trabalhador e a empresa tomadora, independentemente da existência de empresa interposta.

Esse entendimento estava consubstanciado na Súmula 256 do TST, que previa que seriam regulares as contratações de trabalhador temporário e vigilante bancário, dentro dos estritos termos de cada lei.

Essa orientação foi alterada e editada a Súmula 331 do TST, permitindo a terceirização com alguns requisitos restritivos, dentre eles tipo de atividade, mantendo, no entanto, a proibição de interposição de mão de obra.

Com e edição da nova lei, esse aspecto ficou ultrapassado, e mais do que nunca a regularidade da terceirização está voltada ao seu correto gerenciamento, evitando-se sua descaracterização na esfera trabalhista.

E tal irregularidade está diretamente ligada à forma como a tomadora trata os empregados da prestadora, ou os trabalhadores terceirizados (autônomos ou empresários) que a atendem.

Com efeito, a Lei 13.467/17, ao alterar a CLT e a Lei 6.019/74, não alterou nem o artigo 3º da CLT, que trata da definição de empregado, nem seu artigo 9º, que trata da nulidade de atos que visem fraudar direitos previstos na CLT.

E o principal elemento caracterizador do vínculo empregatício é a subordinação, que é a subordinação jurídica.

Assim, o trabalhador terceirizado é empregado da empresa prestadora de serviço e, portanto, está sujeito à subordinação jurídica com ela tão somente, ou, se autônomo ou empresário, sem subordinação a quem quer que seja.

Qualquer ingerência da empresa tomadora na forma e desenvolvimento dos serviços terceirizados através de seu próprio pessoal será elemento que descaracterizará terceirização por configurar subordinação jurídica direta.

A empreitada é um contrato pelo qual a prestadora faz parte da obra com ou sem materiais, devendo ter a expertise para tal atividade.

A empresa, ao terceirizar a compra de um serviço pronto, pode, no contrato civil entre partes, estabelecer punições como multas, responsabilidade por perdas e danos e até mesmo a rescisão contratual se o serviço não sair a contento, no entanto, não pode jamais controlar o desenvolvimento desse serviço, controlando os trabalhadores terceirizados diretamente.

Assim, qualquer forma de subordinação deve ser evitada, e jamais constar de contrato.

Outros elementos também caracterizam o vínculo empregatício e estão dispostos no artigo 3º da CLT.

Pessoalidade: o que é a pessoalidade? A exigência de que determinado trabalho seja efetuado por determinada pessoa, sem possibilidade de substituição.

Assim, exigir que o serviço terceirizado seja efetuado por Fulano, e considerar quebra contratual ou punir o Fulano se não for ele a desenvolver o trabalho, descaracteriza a terceirização.

Voltamos a frisar: terceirização é contrato civil entre contratante e contratada, sem ingerência da contratante no desenvolvimento dos serviços.

A empresa tomadora pode exigir por segurança a identificação dos trabalhadores que serão locados e mesmo o aviso de substituição para efeito de identificação, mas apenas para efeito de sua segurança.

Consequências

Qual o efeito de não se ter a terceirização bem-feita?

Primeiro, precisa-se verificar o que é uma terceirização malfeita.

Terceirização malfeita é a efetuada sem os cuidados na área civil, quanto à correção do contrato e idoneidade da prestadora, e/ou a que não obedece às normas trabalhistas.

A consequência da contratação dentro nas normas trabalhistas, ou seja, uma terceirização legal do ponto de vista trabalhista, mas sem os cuidados de verificação de idoneidade da prestadora e elaboração de um contrato civil, gera, na área trabalhista, a responsabilidade subsidiária ou solidária da tomadora.

Dessa forma, a tomadora responde pelo total do débito trabalhista do empregado da prestadora e que participava dos serviços terceirizados, inclusive em juízo, se a prestadora não pagar esses débitos.

A tomadora terá direito de regresso, ou seja, de cobrar em ação civil própria os débitos da prestadora que ela pagar diretamente. No entanto, se o contrato for nulo, ou a empresa insolvente, a tomadora nada receberá.

Mas situação pior ocorrerá em caso de terceirização irregular do ponto de vista da legislação trabalhista. Nesse caso, se aplicado o disposto no artigo 455 da CLT, haverá responsabilidade solidária pelos débitos trabalhistas, ou seja, o trabalhador que prestou o serviço poderá cobrar seu débito de qualquer das empresas, não havendo sequer necessidade de cobrar antes da prestadora.

Outra cominação que pode surgir é de, havendo a subordinação direta com a tomadora com pessoalidade, considerar-se a existência de intermediação de mão de obra, recurso proibido no Direito do Trabalho, e por força do artigo 9º da CLT considerar-se nula a contratação, reconhecendo-se o vínculo empregatício direto com a tomadora.

A fraude pode até mesmo descaracterizar o trabalho temporário se irregular, que é também uma forma de terceirização com as mesmas consequências acima.

Além disso, há as multas administrativas se a fiscalização considerar irregular a terceirização.

Dessa forma, para uma contratação segura também na área trabalhista, devem ser seguidos os seguintes passos:

  • contratação de empresa idônea;
  • ao contratar autônomos, evitar a pessoalidade e subordinação;
  • ao contratar empresas individuais em que haja pessoalidade do prestador, o que pode acarretar vínculo empregatício, principalmente na locação dentro da empresa, efetuar gerenciamento cuidadoso para demonstrar autonomia em sua atuação;
  • elaboração do contrato de terceirização considerando também a norma trabalhista, e não só a civil — incluir obrigação de envio de cópia de ficha de registro e guias de encargos mensalmente dos empregados locados com retenção de pagamento;
  • não efetuar contratação de trabalhador temporário fora das hipóteses legalmente permitidas e comprovar essas hipóteses na contratação — manter documentada a justificativa;
  • não controlar o serviço diretamente com o empregado locado, não dar ordens nem diretrizes; toda comunicação de problemas é com a empresa prestadora.
  • não manter supervisor próprio na terceirizada para controle do serviço;
  • não efetuar pagamentos, reembolsos ou entrega de benefícios diretamente ao empregado locado.

A rotina de terceirização através da empreitada na construção civil deve ser efetuada de maneira cuidadosa, para evitar o desvirtuamento do contrato, gerando riscos para ambas as empresas envolvidas, mas especialmente para a contratante.

 

 

 

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Maria Lucia Benhame é sócia-fundadora do Benhame Sociedade de Advogados, graduada em Direito pela Universidade de São Paulo (USP) e pós-graduada em Direito e Processo do Trabalho pela mesma instituição.

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Publicado por » Danny Bueno

Especializado em Jornalismo Político e Investigativo. Está radicado nos Estados de Mato Grosso e Rondônia, construiu a carreira trabalhando para sites, jornais e emissoras de TV de Mato Grosso e Rondônia. É assessor de imprensa, é roteirista, produtor de eventos, compositor, editor de conteúdo, relações públicas, analista político e de marketing social. É filiado à ABRAJI - Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo. (http://portaldosjornalistas.com.br/jornalista/danny-bueno)

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